Bem no Alentejo profundo, ninguém diria que uma pacata cidade foi palco de uma das mais belas e dramáticas histórias de amor que o mundo já alguma vez viu, e que rivaliza com as de Pedro e Inês ou de Romeu e Julieta.
Este amor peculiar é neste artigo o ponto de partida para visitar a capital do Baixo Alentejo, não o seu património ou a sua gastronomia, também muito valorizados, claro. Mas falemos de Mariana Alcoforado. A sua história peculiar todos os anos faz correr rios de tinta pelo mundo fora, em livros editados sobre o amor.
Ainda hoje, as paredes de Beja contam histórias fascinantes de outros tempos. Num Alentejo profundo e em tempos idos, uma freira apaixonou-se perdidamente por um militar francês… e por lá podemos ver hoje a janela gradeada de onde via o seu amado. Por lá também vimos a casa onde nasceu e as ruas que calcorreava.
Mas quem foi afinal a freira alentejana que se perdeu de amores por um militar francês? A casa onde nasceu ainda se encontra em Beja e pode ser visitada, o convento para onde entrou aos 11 anos também, a janela que dava para as Portas de Mértola (uma das entradas em Beja quando muralhada) também. E é através destas paredes que a sua história volta a encantar.
Tudo começou no solar da família Alcoforado, onde Mariana Alcoforado (1640-1723) nasceu, no centro de Beja. A família era abastada, mas não sendo primogénita a jovem teve de ingressar aos 11 anos no Convento de Nossa Senhora da Conceição, em Beja, bem perto da casa da família. Fica no centro da cidade e facilmente lá pode chegar.
Foi, então, por volta de 1663, com 23 anos, que Mariana terá visto entrar na cidade, pelas Portas de Mértola para onde dava a sua janela de clausura, um militar francês, de 27 anos, de nome Noel Bouton, que estaria a ajudar as tropas portuguesas a lutar contra as castelhanas na Guerra da Restauração.
Consta que se apaixonaram, que tiveram alguns encontros, mas que ele a terá depois deixado, regressando a França no final da campanha militar. E Mariana ficou a sofrer de amor neste convento em Beja.
As Cartas Portuguesas
É, então, a este militar que Mariana dirigiu as famosas Cartas Portuguesas, atualmente com mais de 600 traduções em todo o mundo e que na altura da sua publicação desautorizada (1669), em França, terão sido um autêntico best-seller em vários países. Afinal, cartas de amor de uma freira não é algo comum em nenhuma época histórica. Esta é, assim, uma grande história de amor para descobrir em Beja e que faz parte dos anais internacionais do amor. Pode encontrar muitas edições na biblioteca municipal da cidade.
As Cartas Portuguesas são constituídas por cinco curtas cartas de amor. Estas missivas transmitem um amor incondicional e exacerbado da jovem Mariana pelo dito militar. Elas transmitem uma enorme dor de saudade e de pedidos desesperados de notícias.
Mariana vivia em solidão e com desejo de ter o seu amado a seu lado, embora em clausura num convento… algo inédito atualmente e muito mais à época. Esse amor transformado em letras fez de Mariana uma autora romântica de expressão transfronteiriça.
O convento da freira apaixonada
O convento onde Mariana Alcoforado passou a maior parte da sua vida é hoje o Museu Regional de Beja. É lá que está a famosa janela e é lá que pode conhecer a sua história e ver muitas representações deste amor, inclusive do artista francês Matisse. Mariana viveu aqui dos 11 anos aos 83 anos, quando faleceu.
São inúmeros os artistas que representaram este amor através dos tempos, seja em pintura, serigrafias, literatura… e algumas delas podem ser vistas aqui.
Na verdade, Mariana é a bejense mais universal, mas é uma figura quase que esquecida pela sua terra natal. A nível nacional e internacional é uma figura muito lembrada. Todos os anos se publicam cerca de 50 edições relativas a Mariana nas mais diversas línguas. Há quem diga que a história de Mariana Alcoforado poderia transformar Beja num destino muito privilegiado de turismo romântico e literário.
Se gosta de histórias de amor, Beja é sem dúvida um destino a conhecer e a descobrir, pois, inesperadamente, foi palco de uma das mãos belas e dramática histórias de amor. Embora ainda desconhecida de muita gente.