Quando uma jovem alemã de 24 anos a estudar em Coimbra tropeçou em Cerdeira em 1988 enquanto caminhava por ali com amigos, a aldeia encontrava-se completamente abandonada. Kerstin Thomas, na altura estudante de artes, procurava um local para instalar o seu atelier e foi amor à primeira vista.
Não se sabe quando é que a aldeia de Cerdeira foi construída, mas os primeiros registos remontam ao século XVII. Escondida num pequeno vale a 700 metros de altitude na serra da Lousã, Cerdeira é uma aldeia de xisto secular que esteve em risco de desaparecer após o abandono da atividade agrícola.
Em 1911, viviam 75 pessoas em Cerdeira, mas em 1980 já o último habitante tinha emigrado, deixando a aldeia à sua completa sorte. Kerstin Thomas conta que quando chegou, percebeu que as pessoas tinham fugido porque não havia condições de vida: não havia eletricidade, saneamento básico ou acessos fáceis à aldeia.
O início não foi fácil, mas havia um grande desejo de fazer renascer Cerdeira. “Sentimos de imediato uma grande vontade de voltar a dar vida à aldeia e trazer até ela uma comunidade de artes”, afirma Kerstin. Foi então que, desde 1988, Kerstin Thomas e Bernard Langer foram recuperando algumas das casas da aldeia da Cerdeira. Mais tarde, em 2000, Natália e José Serra, amigos que tinham conhecido ainda em Coimbra, juntaram-se no esforço de recuperação.
Aos poucos, o projeto de amigos foi ganhando forma e sentido e, a partir de 2006, começou a ser organizado o festival de artes “Elementos à Solta – Art Meets Nature”. Em 2012, arrancou o projeto Cerdeira Village que em 2018 se transformou na Cerdeira – Home for Creativity, um espaço de turismo rural intimamente ligado à criação e à formação artística.
O objetivo do projeto sempre foi promover o turismo e as artes e reabilitar a aldeia de forma sustentável e ecológica. Por isso, Cerdeira foi sendo reconstruída por trabalhadores locais especializados em técnicas tradicionais e sustentáveis de construção, utilizando essencialmente materiais locais e ecológicos como a pedra de xisto, típica da região.
A aldeia foi classificada como conjunto de interesse municipal de forma a proteger o seu património arquitetónico, ficando assim imune a intervenções que a possam descaracterizar ou adulterar a sua traça tradicional. Desta forma, Cerdeira promove o consumo turístico responsável em termos ambientais, culturais e sociais e económicos.
Após vários anos de solidão, Cerdeira tem agora novas estórias para contar sobre habitantes persistentes e com vontade de dar vida e sentido a este lugar, de hóspedes que escolhem a aldeia para passarem aqui as suas férias e de artistas de todo o mundo que a procuram em busca de inspiração. Atualmente, faz parte das 27 aldeias que integram a rede das Aldeias do Xisto.
Uma casa para a criatividade
A Cerdeira – Home for Creativity dispõe de nove casas de xisto recuperadas e de um conjunto de infraestruturas e ateliers de trabalho. Cada uma das casas é uma verdadeira obra de arte, uma vez que todas incluem peças de artistas inspirados pela aldeia e pela sua envolvente natural.
Aqui a natureza e a criatividade andam de mãos dadas, garantindo que nunca faltará a quem visita a aldeia inspiração para criar. Há vários workshops tanto para adultos como para os mais novos: desde a aprendizagem de técnicas como o figurado em cerâmica, iniciação à roda de oleiro, encadernação artesanal, talha em madeira de castanho ou mesmo a atividade de compota em família.
Há também nove roteiros preparados pela Cerdeira para os hóspedes explorarem a região centro do país, com percursos pedestres associados e uma seleção de locais de interesse cultural e histórico, assim como mapas detalhados. Para aqueles que buscam adrenalina podem percorrer trilhos na serra, andar de BTT, fazer canyoning ou voos de parapente.
A Cerdeira tem também uma escola de arte com todas as infraestruturas necessárias para quem quiser ter um primeiro contacto com uma nova arte ou uma experiência criativa mais imersiva: a Cerdeira, Arts & Crafts School. Aqui é possível ter formação dada por artistas conceituados em cerâmica, trabalho em madeira, desenho e pintura.
A beleza das montanhas, o som dos riachos, a natureza que se funde com a aldeia construída em pedra de xisto proporcionam um ambiente acolhedor e inspirador. Aqui vai encontrar a tranquilidade para uma escapada em família ou com amigos e irá certamente apaixonar-se por Cerdeira, tal como Kerstin Thomas se apaixonou há mais de 30 anos.
Colmeal, a tragédia e o renascimento de uma aldeia fantasma
A desertificação do interior é um problema sério em Portugal e uma das suas consequências é o surgimento de cada vez mais aldeias abandonadas. Mas a aldeia fantasma do Colmeal, no concelho de Castelo de Figueira Rodrigo, esconde uma história diferente e única na justiça portuguesa: os seus habitantes foram despejados por ordem do tribunal, em julho de 1957.
3 comentários
Meu Deus que sonho de conhecer ,pois minha bisavó,bisavô é minha avó moravam em cerdeira, vieram para o Brasil minha avó chegou com 8 anos de idade vieram de navio.
Rendido à qualidade dos trabalhos apresentados….sem todo o tempo disponivel que eles merecem mas seguramente para ir desfrutando ao longo do tempo , ler e reler e decidir visitar o muito das suas sugestões…um aplauso merecido!
Olá Edgar. Muito obrigada pelo seu comentário e por nos ler. Boas escapadas!